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sábado, 9 de janeiro de 2010

A morte do meu judaísmo: ou elegia a cultura ídiche

A morte do meu judaísmo:
ou elegia a cultura ídiche

Airan Milititsky Aguiar
Mestre em História, Vice Presidente do Clube de Cultura

Quem não gosta de comer aquela comida que nos lembra a infância, as festas de família, a comidinha especial da mãe, da tia e da avó? Comida com sabor da tradição, às vezes passada de geração em geração, que nos atinge no âmago, é a comida que nos faz ser de verdade, compõe a nossa sabedoria coletiva. Faz parte do sabor das festas familiares encontrar velhos parentes, que ainda sabem contar as nossas historias, de onde vieram, por onde passaram, nossos sofrimentos, as peripécias coletivas e nossas alegrias. Quantos não esperam um Iontev para ter o prazer de sentir o sabor de compartilhar a tradição!
Até mesmo o mais apostata, quando servido de uma boa sopa de kneidalech pede para repetir, afirmando, com brilho nos olhos, que recorda a comida de sua finada e observante mãe. Latkes, Krupnick, Varenikes, Leikech, Guefilte Fish, Blintzes, Borsh, Cholodetz, Ferfale, Fluden, Kugel, Gravlax, Kreplach, Beigalech, Strudel, sem ordem de preferência, são apenas exemplos da comida que tanto lembra esses momentos em que compartilhamos a tradição da forma que mais nos toca, pelo estômago.
É de se estranhar, ou não, que essas palavras não soem loschn-koidesch (língua sagrada-hebraico), e sim a mameloshn (língua da mãe), ecoem Europa Oriental, ecoem Zona de Residência, ecoem Ídiche! Não é de se estranhar, ou é, que um turista brasileiro em Israel, convicto de que lá acharia em abundância os pratos que alimentam seu espírito judaico, sua identidade, ao notar sua ausência nos cardápios dos restaurantes e, ao pedir informação sobre onde comer a comidinha da mamãe tenha como resposta: “vá a um restaurante polonês/russo!”. Sendo assim, a nossa comida judaica em Israel é a comida estrangeira, não judaica. Será que não somos mais judeus?
Se no processo de construção do Estado dos Judeus foi necessária toda e qualquer mediação simbólica que negasse a dispora, cabe lembrar a consignea sionista “ou vocês acabam com a galut, ou a galut acaba com vocês”, será que era necessário a negação de 2000 anos de cultura? Comidas, filosofia, magnífica e esplêndida tradição que hoje se encontra em pequenas bibliotecas que poucos são capazes de consultar, pois a maioria não reconhece mais o fraseado da mãe.
Se ser sionista, ou como pretende o campo sionista, ser judeu é negar a tradição do judaísmo europeu, digo que nada disso me interessa. Os responsáveis pela morte de uma tradição inestimável, a qual atribuem o signo da vergonha e da humilhação, não podem dormir tranqüilos, pois negam um dos princípios básicos da tradição judaica: a honra a memória dos nossos! Eles que não são judeus!

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