Segunda Roda:uma homenagem a Bucefalo Caligulis e Onanlegrense Tavarish

sábado, 9 de janeiro de 2010

MÁSCARAS DE PORTO ALEGRE:

UM ITINERÁRIO DA BUSCA DE UMA SIGNIFICAÇÃO

Airan Milititsky Aguiar*
Desde fins de 2000 busco uma significação para as máscaras presentes em prédios e monumentos de Porto Alegre dentro do corte temporal 1900-1930. O trabalho poderia ter dois momentos distintos, mas formando um todo orgânico: a produção e o consumo dessa forma simbólica.
Enfatizo o consumo, ou melhor, a tradução, no sentido da apreciação. A esfera da produção não possui menor validade de pesquisa. Há, porém, uma lacuna das fontes. Poucos são os registros que indicam, com certeza suficiente, quais artistas confeccionaram tais objetos. Portanto, abordar as lutas internas da esfera da produção torna-se praticamente impossível.
Sempre almejei “fazer a história vista de baixo”, não pretendo, portanto, que este trabalho constitua instância legitimadora das máscaras enquanto obras de arte, mas sim buscar significações possíveis para elas dentro das visões de mundo da época. Tarefa árdua. Que fazer? Inicialmente, utilizei o recurso de registrar a impressão causada à primeira vista. Sentia-me fitado. A partir de tal, aliado à descrição da Gorgona - entidade mitológica grega manifestada e portadora da máscara - criei uma hipótese provisória da máscara enquanto vigilância. Parti então para uma análise espacial: para onde se destinava o emprego das máscaras?


Mascara em fechamento de arco. PortÃo principal Delegacia Fsical/MARGS

O caso emblemático: o antigo prédio da Delegacia Fiscal, atual Museu de Arte do Rio Grande do Sul. Ao aproximar-se da porta de entrada, duas pequenas máscaras, justamente à altura dos olhos, fitam o observador. Acima, no fechamento do arco da porta, encontra-se outra máscara embaixo de uma alegoria representando o comércio e a agricultura . Desnecessário continuar a descrever: elas sempre fitam quem lhes fita! Inclusive com angulações para dar tal efeito. Tal particularidade sugeriu a idéia de “panóptico”, de “induzir no detento um estado consciente e permanente de visibilidade que assegura o funcionamento automático do poder”. As máscaras esquadrinham no espaço com seu olhar o nosso.
Busquei na literatura da época alguma referência a relações de olhar. O titulo me levou “As Máscaras”, de Menotti del Picchia. Trata-se de um certo triângulo amoroso, o jogo de olhares é, na trama, fundamental. Um exemplo:

...
Era tal a expressão do seu olhar profundo,
que não póde existir outro igual neste mundo!
(...)
Tão vivos que, Arlequim, desvairado, os suppuz
duas boccas de treva a erguer brados de luz!
Tripudiavam o bem e o mal nos seus refolhos.

O bem e o mal, o bonito e o feio, o velho e o moço, o bizarro e o convencional, o bestial e o celeste. Como as máscaras do teatro grego, destinadas a cobrir a face de quem a portava, eram duas: a da tragédia e a da comédia. As máscaras em geral em prédios públicos assim se apresentam, em oposições. Tem “a cara lavada” muitas vezes. Quem sabe, um refolho de sua presença a procurar a dos outros e sem dar sentença faz o outro dar a si próprio! Máscara: o espelho de quem a vê.
Esta é uma significação possível, mas como se articula em prática torna-se um novo problema de pesquisa, já dizia Pascal: “A última coisa que se encontra ao fazer uma obra é a compreensão do que se deve colocar em primeiro lugar”. Reflete sobre isso Lucien Goldman: “... o estudo de um problema nunca esta acabado, nem em seu conjunto nem em seus elementos. O pensamento uma operação viva, cujo progresso é real sem ser, entretanto , linear e, sobretudo, sem nunca estar acabado”.

Nenhum comentário:

Postar um comentário